domingo, 5 de dezembro de 2010

CRÔNICA:"As Loucuras do Minotauro"


Autor:Dalton Trevisan

Sabe que toda família curitibana tem um louquinho fechado no porão?
...
Não. Sente no sofá. Aqui é melhor.
Estou com pressa doutor. 
É loiro natural teu cabelo?
Clareio com xampu.
Pensou na minha proposta?
Não vim aqui para isso.
De fato. É que a assinatura na procuração não confere.
Uns rabinhos que inventei. Para enfeitar. Só de nervosa.

Pego na mãozinha
ela deixa.
O que eu quero é isso. Por mim ficava a manhã inteira. Namorando você.  Mãozinha dada. É o que me basta.

Longe o olhinho azul, quem está enjoada de ouvir elogio.

Me achego e beijo a face
sem pintura, que maravilha. Fagueira penugem de nêspera madurinha.

Na boquinha? Bem de leve.
Não.
Hoje está cheirosa.

Perfumou-se para vir aqui. Mais indiferente que pareça.

É francês.
Nem precisa. Já viu macieira iluminada em flor toda suspirosa de abelha?
É você.

...
Me conte a tua vida. Disse que trabalha desde os onze anos. O que aconteceu nos últimos dez?
Primeiro a mãe veio morar aqui. Viúva, uma tropa de filhos. De oito sou a terceira. Ela não se acostumou. Daí eu fiquei. Como um traste esquecido.
Morava com quem?
Na casa de outra menina.
Pagava com meu trabalhinho. Na vida nada é de graça. Daí fui mudando de emprego. E hoje aqui estou. Sofrida e triste.
Esses anos terão sido difíceis. Não quer ou não gosta de falar? A palma de tua mão está úmida. Será de aflita?

Os dedos entrelaçados, vez em quando os aperto
uma em cinco ela responde.
Acho que sim.
De mim não tenha medo.
E hei de ter?
Já que não fala de tua vida. Me conte como você é. Que mãozinha linda. Quanto você tem de quadril?

Não sei.

Afagando e medindo coxa acima.

Calculo uns noventa.
Emagreci bastante.
E o teu peitinho? Posso pegar?

Alcanço o primeiro botão da blusinha branca, já se defende.

Assim não.
Como será que é? Muita vontade de ver o biquinho.
Igual ao das outras.
Aí que se engana. Cada peitinho é diferente. Um tem o bico mais escuro. Outro durinho e rosado. O teu deve ser assim.
Nunca reparei.
Sabe que um é mais pequeno que outro? Será o teu esquerdo?
...
De uma, o seio raso da taça de champanha. De outra, bojudo copo de conhaque para aquecer na palma da mão.
...
Pensou na minha proposta? Umas poucas de concessões.
Como assim?
Primeiro pego na tua mão. O que já deixou. Isso é bom. Me faz tanto bem.

Não me contenho e agarro uma e outra.

Depois te apalpo. Aqui.

Em delírio apalpo a coxa trêmula.

Daí te beijo. Não esse beijinho na face. Um turbilhão louco de beijos.

E dou um, dois, três. De leve, para não assustar.

Enfim um beijo de língua. Que você retribui.

Dardejo a lingüinha de lagartixa sequiosa debaixo da pedra.

Sabe o que é acabar?
...
Sabe ou não?
Para mim é terminar alguma coisa.
Não é bem isso. Os livros dizem orgasmo. A parte mais gostosa do ato sexual. Já experimentou?
Não sei o que é.
Será que é fria? Ou não achou quem te entendesse. Te iniciasse com doçura e paciência. Sabe o que eu faria?
...
Te ajudava a baixar essa calça azul. Abria as tuas pernas. E com este dedinho acordava o teu vulcão.
Credo, doutor.

Interessada, quem sabe. Um tantinho incrédula.

Nunca mais seria a mesma. Chamaria você de nuvem, anjo, estrela.  O que alguém jamais disse a ninguém. Sabe, Maria?
...
Você é a redonda lua verde do olho amarelo...
Nossa, doutor.
...que, aos cinco anos, desenhei na capa do meu caderno escolar.
...
Mimosa flor com duas tetas. Dália sensitiva com bundinha.
...
Uma empadinha recheada de camarão e premiada com azeitona preta.
...
Já viu canarinha branca se banhando de penas arrepiadas na sua tigela florida?
...
Você faz de mim uma criança com bichas que come terra.
Assim eu encabulo, doutor.
No meio das pernas um botão chamado cli-tó-ris. Ali é que meu dedinho ia bulir.

Cada vez mais afrontada e afogueada.

Depois te beijava da ponta do cabelo até a unha encarnada do pé.  Cada pedacinho  escondido de teu corpo. Afastava essa coxa branquinha de arroz lavado em sete  águas. E me perdia no teu abismo de grandes lábios de rosa.

Agora a mãozinha quente e molhada.

Sou homem de certa idade. Com a minha vivência faria você sentir prazer até no terceiro dedinho do pé esquerdo. De tanto gozo sairia flutuando pela janela sobre os telhados da praça Tiradentes.
...
E virgem, se quiser, você continua.
...
Juro que te respeito. Como está me vendo assim eu fico: todinho vestido. De colete abotoado e gravata. 
...
Até de óculo. Só tiro o paletó. Nenhum perigo para você.
...
Em troca dessa alegria lhe ofereço um prêmio. Duas notas novas.
...
Quer experimentar hoje?
Próxima vez eu resolvo.
Por que não agora? Já está aqui. Tão fácil. Até chovendo. Mais aconchegante.
Hoje, não.
Você que sabe. Só não creio na tua frieza. Tudo me diz que é moça fogosa. Essa boca vermelha e carnuda. É de quem gosta. Mais uma coisa, anjo. Enquanto eu falava, o teu narizinho abria e fechava.
...
Veja. Como está fremente.
...
Ninguém te diz nada? O noivinho não te canta?
Cantar, todos cantam. Eu sei me defender.
Por que a cisma da virgindade? Se gosta dele, algum mal em deitar no sofá?
Prefiro assim. Ele é ciumento. Sempre está brigando.
Monstro moral. Só quer para ele. Já provou beijo de noventa segundos?
Não contei.
Ao teu noivo falta imaginação. Fico um dia inteiro olhando você. De joelho e mão posta.  Louvado essas graças que Deus te deu. Agora um beijinho. Na boca.

Seguro o rosto, forcejo, ela resiste.

Ah, ingrata. Que tamanho o teu pé. Isso você sabe.
Trinta e cinco.
Bonitinho deve ser. Aposto que sem joanete. Sabe que as moças se masturbam? Você não tem experiência? Todas têm. De noite pensa num rapaz bonito e brinca com o dedinho. Nunca fez isso?

Sem resposta.

Teu noivo é bonito?
Nem tanto.
Então algum artista famoso. Deixa ler a palma da mão.

De repente muito curiosa.
Este xis é uma boa notícia. Que não esperava.
O quê?
Rolar comigo no tapete.

Nem sorri.
Você não sonha, amor?
Todos sonham. Eu, ter o meu cantinho.
Não é isso. De olho aberto. Visões eróticas. Em toda família...
É tarde. Preciso ir, doutor.

-- Então me dá um abraço. Assim.

Envolvo-a nos braços. Ela não corresponde.
Ai, me deixa. Beijar essa carinha mais santa.

E osculo as duas faces rosadinhas.

Agora a tua vez.

Um furtivo beijo. Seco, unzinho só.

Aqui o teu presente.
Não posso, doutor.

-
Sabe que toda família curitibana...
Sou moça de princípios.
...tem um louquinho fechado no porão?
Cruzes, doutor.

Ó maldito Minotauro uivando e babando perdido no próprio labirinto.

Me trate de você. Doutor já não sou. Apenas um doidinho manso. De paixão cativo.

Indecisa, morde o beicinho.
De mim o que vai pensar?

Guarda na bolsa as duas notas. E concede o primeiro sorriso.

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