Autor:Plínio Marcos
Zé Mané |
— Tou fazendo anos hoje.
A turma fez a milonga:
— Boa! Parabéns!
— Quer dizer que hoje tu paga as manguaças?
— Tem que pagar. Afinal, o Zé não faz anos todo dia.
E o Zé Mané não escamou:
— Hoje é comigo mesmo. Nem vou pro batente.
Os parceiros não duvidaram. Mas quiseram saber da situação. O Ditinho Preto, mais chegado ao Zé, tomou a liberdade:
— Tu tá com grana pra garantir, Zé?
Naturalmente, o aniversariante não tinha um tostão no bolso. Mas nem se tocou.
Confiando no Seu Joaquim Portuga, tirou de letra:
- Eu sei de mim. E, se mando ver, é porque garanto. Ô meu, tou fazendo trinta anos. Não sou nenhum moleque!
Encabulado, o Ditinho se desculpou:
— Não, eu sei. Mas é que nós, quando se dana a beber, bebe mesmo.
Todos riram. E o Zé Mané fez o apontamento:
— Sete e pouco tamos lá no boteco do Seu Quim.
- Eu sei de mim. E, se mando ver, é porque garanto. Ô meu, tou fazendo trinta anos. Não sou nenhum moleque!
Encabulado, o Ditinho se desculpou:
— Não, eu sei. Mas é que nós, quando se dana a beber, bebe mesmo.
Todos riram. E o Zé Mané fez o apontamento:
— Sete e pouco tamos lá no boteco do Seu Quim.
— Hoje é festa, Seu Quim. Bota aí, que não tem chibu. Tou fazendo trinta anos.
Com essas e outras, todo o gango se empapuçou. Já tinha nego cercando frango quando um gaiato resolveu tirar sarro com a fuça do dono do boteco. Sabendo que o homem era bronqueado com anedota de português, o pilantroso atacou na ferida:
— Escuta aqui, Zé Mané. Tu sabe que falaram pra um cutruco que ele tinha que pagar Imposto de Renda na fonte e o labrego acabou morrendo afogado?
A curriola estourou de rir. E conversa puxa conversa. Cada um sacou um esculacho em português. O Seu Joaquim azedou. Como não era homem de comer enrolado e não queria briga, resolveu acabar com a festa. E deu o aviso:
— Bom, já é tarde. Eu vou fechar 0 bar. Não sirvo mais nada, que já tão todos de pé queimado. Seu Zé Mané, o senhor que é o dono da conta, me faz favor de acertar e ir contar piada de português em outro canto. Aqui não quero isso.
Teve estrilo. Quás-quás-quás grosso. Porém, como era mais de meia-noite, o Zé Mané deu uma pá de cal na festa. Olhou no relógio e acalmou os ânimos:
— Acabou a festa. Meu aniversário foi ontem.
A patota se conformou. Já iam se mandando quando o Seu Joaquim deu o arrocho:
— E a conta? Quem paga?
O Zé Mané não balançou pra responder:
— Pendura.
Joaquim Portuga |
— Não tem papo. Vai pagar já.
Pro Zé, que não tinha dinheiro, a novidade valeu por uma paulada. E deu a volta em tom bravo:
— Pendura, já falei. Sempre pendurou, por que vai fazer onda agora?
Teve início um bate-boca:
— Pendurei os sortidos.
— E eu sempre paguei.
— Mas bebida eu não vendo fiado.
— Agora que tu avisa?
— Tu já devia saber que não vendo bebida fiado pra vagabundo nenhum.
— Vagabundo é a mãe.
Xingar a mãe é sempre início de confusão. 0 português passou a mão num cacete, pulou o balcão e cobriu o Zé Mané de pancada. Ninguém se meteu. O Zé, bebum, mal podia com ele mesmo e apanhou coisa que preste. Ficou estarrado no chão quase morto. E só com muito custo impediram o português de mandar o Zé falar com Deus. O Ditinho Preto e os outros companheiros de quarto guindaram o Zé Mané. E a bagunça acabou aí.
No dia seguinte, Seu Joaquim estava firme no boteco, atendendo a freguesia, quando o Ditinho Preto se apresentou falando macio:
— Seu Joaquim, o Zé Mané tá com vergonha do que aconteceu ontem e pediu pro senhor ir ali na esquina, que ele quer acertar as contas com o senhor.
O português entrou no grupo. Até bochichou:
— O Zé é bom rapaz. Ontem ele estava bebido. Hoje ele acerta e fica tudo por isso mesmo. Vamos lá.
Na esquina, o português encontrou o Zé Mané. Mal viu o loque e manjou qual era o acerto. Quis correr, mas não deu.
O Zé Mané meteu uma lapa de faca que não tinha mais tamanho na barriga do Seu Joaquim. O homem ficou embarcado. Mas, antes de morrer, ainda escutou o recado do Zé:
— Assim tu aprende a respeitar um pinta que faz aniversário.
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